Este título – Direito a falar... com o dedo no ar – foi-me sugerido por uma criança da EB1 JI do Cerco do Porto, a propósito dos direitos da criança
Para falar temos de pôr o dedo no ar. Se falarmos todos ao mesmo tempo fica muita confusão e não nos entendem . Má comunicação.
Na verdade, crianças e adultos já incorporaram a ideia de que as crianças têm direito a falar, embora isso se deva processar com ordem, para que seja perceptível, como elas mesmo dizem.
Esta constatação é um progresso no que respeita aos direitos de comunicação das crianças, porque na escola já houve um tempo em que as crianças tinham apenas o direito de ouvir.
O direito a falar é encarado com naturalidade por toda a gente. É um direito reconhecido e valorizado.
O que eu defendo é que brincar é um direito da criança tão fundamental como o direito a falar, não necessariamente no tempo lectivo, mas no tempo pós-lectivo. Um tempo em que frequentemente se obrigam as crianças a fazer actividades em tudo semelhantes às do tempo lectivo (pela metodologia que se usa, por não as envolvermos na organização e programação, por serem demasiado orientadas, sem deixar para a criança a hipótese de explorar ...)
O que eu de facto gostaria de ver era uma criança a levantar o dedo pedindo para brincar, e que isso fosse reconhecido por ela e pelos adultos, que com ela convivem, como um direito tão natural e tão irrenunciável como o direito a falar, a comer e a ser bem tratado.
Há tempo para tudo e há todas as possibilidades que quisermos mas, neste momento, o acto de brincar não é reconhecido como direito fundamental, porque as pessoas têm uma informação muito vaga, limitada e pouco precisa do que significa brincar.
O mesmo sucede, às vezes, com o jogo, que é entendido somente como exercício físico ou desporto, interessante para a saúde ou para o desenvolvimento motor, ignorando o seu potencial como forma inegável de ligação das crianças ao mundo.
Brincar, para a criança, é viver e é tão importante e tão fundamental como qualquer outro dos direitos que consideramos fundamentais e que estão consagrados na Convenção dos Direitos da Criança.
Na verdade, não dar tempo à criança para brincar, não reconhecer esse direito no seu tempo livre, é uma violência tão grave e punível, como não dar de comer ou maltratar fisicamente. Constitui além dessa violência, uma falta de percepção do que significa brincar e da forma como as crianças fazem a leitura da realidade social. As crianças aprendem pela experiência, à medida que vão interagindo com o seu grupo de pares e com os adultos e à medida que vão vivenciando diferentes situações.
Reconhecer e valorizar o acto de brincar é, ainda, dialogar com as crianças numa linguagem que elas entendem, respeitar o(s) seu(s)tempos, escolhas e decisões. É comunicar, interagir e respeitar.
Maria José Araújo
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